A pandemia provocada pela Covid-19 deixa ainda muitas indefinições nos mercados, mas as empresas já têm se movimentado em torno de uma certeza: as relações de trabalho nunca mais serão as mesmas. Para adaptar seus espaços ao “novo normal” daqui para frente, companhias como a gigante de tecnologia Google já estão reformulando escritórios e preparando o ambiente para receber seus colaboradores de forma a aliar o conforto dos reencontros ao vivo e em cores, mas sem abrir mão da segurança – um paradoxo entre aproximação e distanciamento difícil de resolver.
Para chegar à melhor solução possível, o Google recorreu ao Archathon Workplaces 2020, um “hackathon” de arquitetura e design promovido pela Archademy, Market Network do setor no Brasil. Durante um mês, profissionais e estudantes do setor promoveram um debate sobre os novos conceitos e objetivos do ambiente de trabalho e apresentaram projetos possíveis para a reformulação de um andar inteiro do Google em Belo Horizonte, primeira sede da gigante de tecnologia no Brasil, que acabou de completar 15 anos.
Quem venceu a “batalha de arquitetos” foi o escritório Ultra, de Porto Alegre, dos sócios Arthur Lauxen, Bruna Feltes e Beatriz Matte, com mentoria das mineiras do Estúdio Base. O Ultra conquistou um contrato de R$ 30 mil pela proposta do projeto.
Uma Comissão Técnica, composta pelos escritórios renomados Todos Arquitetura, Pitá Arquitetura e SuperLimão, julgou os projetos dos mais de 100 participantes do Archathon Workplaces 2020, sendo responsável pela escolha dos 5 finalistas.
A escolha do conceito vencedor foi feita por um colegiado do Google Brasil, com a presença do Diretor de Real Estate Project Executive – Latin America, João Vieira e do próprio CEO Brasil, Fábio Coelho. “Os resultados foram ótimos, tivemos um feedback interno super positivo, e, principalmente, acabamos promovendo uma ótima discussão sobre o futuro dos nossos espaços”, pontuou Vieira. O processo de seleção também foi auxiliado pelo escritório BCMF e MACh Arquitetos, responsável pelo atual projeto da empresa em Minas Gerais.
Os detalhes da solução não podem ser revelados ainda, mas algumas de suas características principais já apontam para uma forte tendência que as empresas do mundo todo devem seguir daqui para frente.
“Por conta da pandemia, as empresas devem manter espaços físicos apenas para equipes que dependem da interação para criar e trocar ideias, mas as tarefas operacionais podem ser feitas remotamente, fora do escritório. Desta forma, existe uma crescente demanda por projetos que trabalham com o conceito de escritório vivo, onde os ambientes são totalmente flexíveis e customizáveis”, explica Lauxen. No caso do Google, cerca de 70% dos profissionais seguirão com uma rotina de jornada flexível, sem a necessidade de comparecer ao escritório todos os dias.
Em casos como este (que tendem a se tornar mais comuns mesmo no cenário pós-pandemia), o design do escritório deve ser pensado para comportar arranjos diferentes das estações de trabalho e do mobiliário, para que não pareça vazio nem cheio demais, conforme o número de pessoas que forem trabalhar no dia. E, para chegar a uma equação que garanta o distanciamento necessário nessa reordenação, os arquitetos da Ultra lançaram mão de tecnologia. “Desenvolvemos uma solução com a plataforma Arduino que faz os ajustes necessários do ambiente em tempo real, conforme parâmetros estipulados pelos gestores”, afirma Lauxen.
Outro ponto importante em qualquer projeto adaptado para o “novo normal” é a escolha de materiais, que precisam ser resistentes para não deteriorar com o uso mais constante de produtos pesados de limpeza, e impermeáveis, para não acumular vírus, bactérias e germes que podem transmitir doenças.
Para os arquitetos João Panaggio e Caio Coelho, da equipe Coelho-Panaggio, que figurou entre os semifinalistas do Archathon, a pandemia voltou o olhar das empresas para ambientes mais funcionais e menos rígidos. “Esse período de isolamento mostrou às companhias que um espaço deve existir em função das pessoas, e não o contrário. Adaptabilidade e flexibilidade, portanto, são conceitos-chaves que os projetos precisam incorporar para que o retorno das atividades cumpra com o propósito de integrar as pessoas e permitir o compartilhamento do ambiente com segurança”, avalia Panaggio.
O projeto desenvolvido pelos arquitetos também esteve baseado no conceito de arquitetura aberta. “Montamos grids para delimitar espaços fáceis de reordenar. com painéis e estações de trabalho móveis, e repleto de elementos que trazem aquela sensação de estar em casa, de conforto, com bastante plantas. O espaço de descompressão também era todo ajustável para atender quantidades diferentes de pessoas por dia, sem perder um perfil aconchegante e descontraído”, afirma Panaggio.
Assim como o Google, muitas empresas estão aproveitando o período de isolamento para reformular os ambientes e adaptá-los à nova realidade das relações de trabalho. Levantamento da Archademy, com mais de 650 escritórios de arquitetura e design de interiores do país, mostrou 73,1% dos profissionais do setor receberam solicitações de projetos corporativos durante a pandemia. Ao todo, 44,3% perceberam mudanças nessas demandas.
Dentre elas, 29,7% eram referentes à readequação de layout, para respeitar o distanciamento social. Já 26,6% precisavam de projetos para escritórios mais enxutos e 18,8% queriam adaptar o ambiente para atender à rotatividade advinda do home office.
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