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É hora de ampliar a maneira de se ver o compliance

Antônio Carlos Hencsey*

Uma das frases mais utilizadas quando se fala de compliance é o famoso “tone at the top”, também conhecido como comprometimento da alta direção. Ele é tido como um dos principais pilares de um programa de compliance e sem o qual toda a força das diretrizes se esvai. Mas será que um apoio e exemplo vindo dos executivos é o suficiente para conquistar o engajamento dos demais profissionais da organização?
Albert Bandura, um dos ícones contemporâneos da psicologia social, mostrou por meio de seus estudos que o exemplo é um forte elemento de contaminação positiva ou negativa quando falamos de comportamento. O simples fato de observarmos a ação dos demais pode ter um efeito decisivo entre agir de uma maneira ou outra, mesmo que não tenhamos interação direta com o indivíduo que nos serve de exemplo. Porém, não é só esse fator que interfere na intenção de seguir, ou não, regras corporativas.
Para que se potencialize ao máximo a participação ativa e positiva dos colaboradores às regras instituídas é necessário que a empresa promova uma cultura ética sólida e isso só é possível envolvendo os funcionários nessa construção. O ser humano é naturalmente avesso à imposição de regras e a percepção de que há uma obrigatoriedade que cerceia uma liberdade individual torna, na visão de muito, o compliance inimigo número um do bom ambiente de trabalho.
Quando falamos com profissionais dos mais diversos níveis e áreas, é muito comum estes descreverem o compliance como uma área que impacta a produtividade, o relacionamento interno, externo e, até mesmo, o clima corporativo. As regras são seguidas para se evitar contratempos ou punições e não necessariamente porque fazem sentido ou têm apoio da equipe de colaboradores.
Para que a reversão dessa percepção ocorra é preciso dar voz aos funcionários, não importando nível hierárquico ou função. A empresa que quiser realmente que o seu programa seja efetivo precisa ouvir aqueles que se submetem às regras trabalhando de maneira direcionada a fim de gerar conhecimento, compreensão e eliminar crenças negativas sobre os elementos presentes na estrutura de compliance.
Por mais obvio que seja, muitas empresas prejudicam seu programa logo na primeira regra: É necessário se conhecer uma diretriz para segui-la. Se o funcionário não tem claro o que fazer não se pode esperar que ele se comporte obrigatoriamente como o esperado, e a experiência diária com ética corporativa mostra que muitas organizações se frustram por não ter esse alinhamento claro.
O segundo ponto é ter certeza de que o que foi explicado e apresentado foi compreendido da forma correta. Ruídos de comunicação e divergências de interpretação interferem diretamente na aplicação adequada das regras e ferramentas. A companhia deve se certificar de que todos sabem o que fazer e como fazer.
Há um outro elemento muito negligenciado por implantações e análises de programas de compliance que é cabal para o sucesso da criação de uma cultura ética corporativa: O que as pessoas acham das regras e diretrizes estabelecidas. Dar importância e voz aos funcionários fará toda a diferença na adesão destes ao que é eticamente esperado. Não se pode esquecer que o objetivo final de um programa maduro e efetivo é que a maioria dos profissionais adotem as regras de forma internalizada e positiva, e não para não serem pegos ou evitar punições.
Assim, compreender históricos, identificar divergências percebidas entre a prática e a teoria e, principalmente, dar ao colaborador o senso de dono ou construtor parceiro de uma nova cultura ética corporativa aumentará o engajamento e a proteção de algo que não é mais imposto, mas, sim, edificado conjuntamente para trazer melhorias no ambiente, produção e transparência corporativa.

* Antonio Carlos Hencsey é sócio da prática de Ética & Compliance da Protiviti, consultoria global especializada em finanças, tecnologia, operações, governança, risco e auditoria interna.

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