É difícil, por ora, saber qual foi o real crescimento da banda larga no país em 2023. Os dados da Anatel têm passado por revisões. O site da agência apontava no final do ano que, em outubro, havia 49,2 milhões de conexões banda larga fixa ativas no país. Já no início de janeiro, o número daquele período foi revisto para 48 milhões, enquanto que os dados de novembro, revelados na ocasião, apontam 47,2 milhões, 1,8 milhão a mais que no final de 2022. Mesmo que a última estimativa venha a ser revista para cima, por conta da recorrente subnotificação por parte dos ISPs, o total de novos acessos ao longo de todo o ano passado deve ficar ao redor de 2 milhões, a adição mais baixa registrada desde 2020. Aparentemente, se confirmará a tese de que a demanda por Internet está próxima de seu limite. Isso, porém, não é suficiente para afastar o capital do segmento.
O interesse de investidores pelos ISPs tornou-se evidente durante a pandemia, quando a chegada dos juros básicos a seu patamar histórico mais baixo levou recursos da renda fixa para a economia real, onde os provedores regionais promoviam o boom da banda larga no país. Mesmo quando o cenário não era favorável – com a pressão inflacionária motivando altas sucessivas da Selic, até que esta chegasse aos 13,75% ao ano em agosto de 2022 – o apetite não arrefeceu e hoje, com a melhora dos indicadores econômicos, tende a se intensificar, porém, por outras razões. Ao longo dos anos, enquanto o potencial de crescimento da banda larga diminuía, o atrativo maior passou a ser a ainda elevada pulverização do setor.
A onda de fusões e aquisições que transcorreu ao longo dos últimos anos chegou, em 2023, aos PPPs líderes de mercado. O estopim foi a fusão Vero/Americanet, anunciada em julho, que criou o quinto maior provedor de Internet do país, como 1,4 milhão de acessos fixos. Forçados a realizar movimentos semelhantes, os concorrentes agiram. A Brasil TecPar adquiriu a Blink, ampliando sua base para 600 mil clientes. Ao comprar a paulista Webby Internet, a Alares chegou 627 mil conexões. A Unifique acabou por incorporar a catarinense Vex Telecomunicações em dezembro, o que elevou sua carteira para mais de 740 mil usuários.
Outros M&As envolvendo grandes players certamente são negociados neste momento e deverão vir a público em breve. Porém, sem chamar a atenção, a concentração entre os menores foi – e permanece – mais intensa.
Conforme a 5ª edição da pesquisa TIC Provedores, divulgada em dezembro pelo Cetic.br, o número de ISPs em atividade no país caiu de 12.826 para 11.630 entre 2020 e 2022. O estudo não menciona isso, mas, enquanto essa redução ocorria, o número de conexões fixas de banda larga foi de 36,3 milhões para 45,4 milhões, uma alta de 25%.
A razão consta na TIC Provedores: as empresas de médio porte do segmento – com 50 a 249 trabalhadores – passaram de 13% a 17%, enquanto que as micro – com até nove funcionários – despencaram, de 56% a 46% do total de ISPs ativos. Os percentuais refletem incontáveis fusões e aquisições, que deram maiores porte e carteiras a muitos provedores. E, se entre os líderes do segmento os M&As têm-lhes proporcionado levar seus serviços a outros estados, entre os menores também se observa expansão geográfica. Conforme o estudo, o número de prestadores que atuam em apenas um município caiu de 47% para 40%.
Por maior que tenha sido a concentração em todos os níveis do segmento, ela ainda tem muito espaço para avançar. Estudo apresentado no final de 2023 pelo conselheiro da Anatel Vicente Aquino durante a elaboração do novo regulamento geral de direitos dos consumidores de telecomunicações apontava que 93,3% dos prestadores de SCM dispõem de menos de 5 mil acessos. No cenário atual, com maior número de provedores de médio porte, a velocidade com que esses ISPs menores são incorporados cresce, enquanto seus compradores passam a ser observados com maior atenção pelos grandes, que, com os M&As dos concorrentes, terão de seguir o mesmo caminho para não perderem mercado.
Da mesma forma que a concentração, a busca pela satisfação do cliente também se propaga por todos os níveis do mercado. Grandes operadoras, que têm investido na ampliação de suas redes de fibra – tecnologia que tem historicamente como principais detentores os PPPs –, passam a priorizar a experiência do usuário como forma de fidelizá-los. Isso se dá, dentre outros, com ofertas de serviços de valor adicionado que alteram antigos modelos de negócios, como ocorre com a Claro, que acaba de adicionar o Netflix ao seu serviço de TV por assinatura. Esse caminho já era trilhado pelos ISPs, que, por conta da intensa competição entre seus pares, ofertam, há tempos, desde pacotes de canais gratuitos a plataformas de streaming.
O mesmo se dá com a gestão dessas empresas. Dentre outros, grandes operadoras passam a incentivar o uso do cartão de crédito por seus clientes em detrimento à cobrança por meio de emissão de boletos, garantindo assim, receitas recorrentes em um modelo – o pré-pago – que reduz custos e risco de inadimplência – este último, a cargo do emissor. Da mesma, a multiplicação de players com carteiras que giram ao redor de um milhão de clientes eleva também rigor quanto a governança e compliance, tornando-o norma tanto para se permanecer no mercado quanto para ser atrativo a eventuais compradores.
Independentemente do nível de crescimento do setor em 2023, o número de empresas permanecerá em queda, tanto por conta de uma demanda que cai, inviabilizando o surgimento de número relevante de novos ISPs, quanto pela ação de investidores e players no sentido da concentração, o que é favorecido pela tendência de queda dos juros. O mercado acelera seus passos rumo a empresas de maior porte, bem geridas e que satisfaçam o consumidor.
Fabrício Viana, sócio da VianaTel.
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