Destacada pelo presidente Lula em seu discurso de posse ao Congresso como uma das prioridades de seu governo, a universalização do acesso à Internet no País implica em inserir no ambiente online um número de pessoas superior à população da Austrália.
Segundo o IBGE, mesmo com a expansão dos últimos anos, que conectou 90% dos lares brasileiros, há ainda 28,2 milhões de pessoas com 10 anos ou mais – 15,3% da população nesta faixa etária – excluídos da rede, o que dificulta ou até impede seu acesso a cultura, informação, conhecimento, serviços públicos, transações financeiras dentre tantos outros.
Ainda é difícil saber que políticas serão colocadas em prática para que esse objetivo seja alcançado. É certo, porém, que qualquer ação efetiva envolverá os provedores regionais.
Por ora, a única sinalização do que poderá ser feito surgiu durante o período de transição do novo governo, quando se discutia a criação de um programa voltado ao barateamento dos pacotes de dados para famílias de baixa renda.
De fato, custos são dos principais obstáculos ao crescimento da Internet no País. Conforme o IBGE, preços, seja dos pacotes (14%), seja de equipamentos como PCs, notebooks ou smartphones (6%), são apontados como principal impedimento para 20% dos que não dispõem do serviço.
Apesar de o número de conexões fixas ter superado o de móveis nos domicílios em 2021 (83,5% ante 79,2%, segundo o IBGE), o smartphone ainda é a única ferramenta usada por 90% dos usuários de Internet das classes D e E, conforme o Centro de Estudos sobre Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic). E, nesses casos, se há conexão, os valores acabam limitando o tempo de navegação de número significativo de pessoas.
Entre brasileiros das classes C, D e E que dispõem de acesso móvel, 45% têm o serviço interrompido sete dias ou mais por mês, por conta do esgotamento de seus pacotes de dados, segundo estudo realizado pelo Instituto Locomotiva e pelo IDEC em julho e agosto últimos.
De qualquer forma, o fator preço não é o único e, talvez, nem o maior obstáculo à universalização da Internet no país. Por maior que tenha sido a expansão das redes promovida pelos ISPs, que as levaram a regiões ignoradas pelas grandes teles, há 20 milhões de brasileiros habitando áreas sem qualquer tipo de conectividade à banda larga, conforme estudo realizado pelo BID e pela Anatel entre abril de 2021 e março último.
Cada um desses entraves pode ser superado pelos ISPs, que têm grande interesse nesse tipo de ação. O que mais os motiva é a abertura de novas áreas e a ampliação do público para a entrega de Internet rápida, sua principal oferta, cuja demanda, em declínio acentuado, sinalizava, para muitos, esgotamento. Os números da Anatel endossavam essa tese.
Em 2020, quando houve a eclosão da pandemia e o consequente boom da banda larga no país, o número de conexões de Internet rápida saltou 10,2%; no ano seguinte, 14% e, em 2022, até outubro, apenas 5,5%.
O crescimento do passado recente comandado pelos ISPs acabou por transformar seu mercado. Sem ter mais como registrar crescimento orgânico expressivo, os provedores passaram a viver em um ambiente de competição acirrada, em que a incorporação de novas ofertas a seus portfólios, como serviços de valor agregado, serviu para elevar seus ganhos, via aumento de ticket médio ou conquista de quem era atendido pela concorrência.
Paralelamente, e num ritmo até mais intenso, o setor vivenciou uma onda de M&As, que segue em curso sem sinais de arrefecimento. Desse quadro, emergiram ISPs melhor geridos e mais fortes, resultantes tanto do ingresso de investimentos ou da realização de fusões e aquisições, quanto da assimilação do que é necessário à sobrevivência nesse novo mercado – enquanto sonham em ser incorporados por algum concorrente.
Aos dois grupos, que juntos formariam um contingente de 14 mil empresas, segundo a Abrint, disponibilizar acesso à Internet aos que ainda não a usufruem interessa bastante. Tanto que a participação dos provedores em programas de inclusão digital foi uma das principais demandas levadas pela entidade em sua primeira reunião com o novo ministro das Comunicações, Juscelino Filho.
A universalização da Internet no País passa pela ampliação do alcance do serviço, o que implica tanto em novas redes de fibra óptica quanto no aumento da oferta de sinais de satélite ou rádio em locais onde eles hoje não existem, tal qual os ISPs fizeram nos últimos anos. Agora, mais fortes, essas empresas são mais do que capazes de protagonizar, novamente, a inclusão digital.
Isso inclui também as conexões móveis. Em julho de 2022, por exemplo, os PPPs lideraram o acréscimo de novas linhas 4G, alcançando ali a marca de 5,4 milhões, ou 3% de market share na tecnologia. Embora atuem na telefonia móvel, geralmente, como representantes comerciais das concessionárias, novamente, foram os provedores regionais os protagonistas na ampliação do mercado.
Aumentar o público consumidor também passa por convencimento. Conforme o IBGE, entre os 28,2 milhões que não acessam a Internet, 42,2% apontam como determinante para tal não saberem navegar, enquanto outros 27,7% não tinham interesse em fazê-lo.
A comunicação, se conduzida por agências especializadas no segmento, é capaz de levar campanhas a esses públicos para esclarecê-los sobre como trafegar na Web e sobre os benefícios por ela proporcionados – como o acesso, via Internet, a serviços públicos como agendamento de consultas médicas, realização de matrículas escolares, emissão de documentos e faturas de impostos, dentre outros disponibilizados por quase todas as prefeituras e principais órgãos públicos do país – para, assim, converter muitos em novos clientes.
O compromisso do novo governo em inserir milhões de brasileiros no ambiente digital abre novas perspectivas para o mercado dos ISPs. Dentre outros, reaviva o crescimento via oferta de novas conexões como fonte relevante de receitas. A importância social da iniciativa justifica a criação de diferentes tipos de programas oficiais, que passarão necessariamente pela Anatel. Esses bons ventos chegarão, portanto, apenas aos provedores devidamente regularizados.
Por Fabio Vianna Coelho, sócio da VianaTel e da VianaCom.
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