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O segredo da Computação Quântica

A Física Quântica ficou popular com o livro O Segredo, que fala sobre Lei da Atração, mas o computador quântico não tem nada de esotérico, promete processamento milhões de vezes acima dos supercomputadores atuais e deve estar acessível como serviço em Nuvem

O segredo da Computação Quântica

A Computação tradicional é um universo binário – bits, no qual 0 e 1 funcionam como chaves para que o processamento seja realizado, algo como um mundo restrito ao sim e não. Essa realidade que está sendo alterada com a Computação Quântica e seus qubits, que são capazes de resolver equações e problemas complexos a partir da velocidade de processamento multiplicada aos milhões. O que explica esse salto tecnológico é que as máquinas Quânticas aumentaram o vocabulário na comparação com a dos computadores atuais, incorporando o ‘talvez’, o ‘sim e não’ ao mesmo tempo e outras variantes de respostas. Isso faz com que os computadores Quânticos realizem operações que demandam equações que podem até mesmo ter característica de sobreposição e inferência de informações. isso não significa que a Computação  tradicional será substituída, mas que poderão conviver em harmonia.

Sobre a convivência das arquiteturas, tradicional e Quântica , Bruno Domingues, CTO para a Prática da Indústria de Serviços Financeiros da Intel, é bem incisivo: “a Computação Quântica não deverá substituir a tradicional, ou também conhecida como clássica. Obviamente, a Quântica  tem pela sua natureza vocações para um conjunto de problemas em que a máquina de Turing, a origem da concepção binária, não é a mais adequada”, comenta. Ou seja, o mais provável é o surgimento de uma Computação  híbrida, em que certas aplicações serão mais bem servidas por computadores quânticos, incluindo a Nuvem e sua capacidade massiva de processar dados, e outras em que o computador clássico será a melhor opção.

A consultoria McKinsey prevê que até 2030 a tecnologia de Computação Quântica deve estar presente em algo entre dois mil e cindo mil computadores no mundo

A origem
Derivada da Física Quântica – que já está presente em televisores e celulares -, a Computação Quântica é relativamente nova. As primeiras formulações teóricas surgiram na década de 1950, porém o primeiro computador Quântico comercializado, o D-Wave One, da D-Wave, surgiu em 2011 com capacidade de 128 qubits. Entretanto, ele ainda atuava em conjunto com máquinas tradicionais.

Passados dez anos, o mercado ainda apresenta um cenário incipiente. E a projeção é que essas máquinas superpoderosas serão para poucos. A consultoria McKinsey apontou que até 2030 a tecnologia de Computação Quântica deve estar presente em algo entre dois mil e cinco mil computadores no mundo.

Mas existem formas de apresentar a tecnologia. A Fujitsu, por exemplo, disponibilizou o Digital Annealler, sua plataforma Quântica, no Brasil em junho de 2021. E já tem conversas com clientes e parceiros para o uso da tecnologia com foco em otimização de larga escala para logística, operações, análises de riscos, portfólios de investimento, entre outras aplicações.

O Digital Annealler é um processador digital inspirado em Computação  Quântica , apto a trabalhar com problemas combinatórios ultra complexos, como a pesquisa de medicamentos ou operações logísticas de grande porte. “No âmbito global, temos uma parceria de pesquisa com o Instituto Riken, no Japão, para o desenvolvimento de um computador Quântico com base em supercondutores até 2025, e desde 2018 temos também disponível a plataforma”, explica Alex Takaoka, diretor de Vendas da Fujitsu do Brasil.

Para equilibrar esse jogo, alguns fornecedores planejam fornecer a Computação Quântica como um serviço na Nuvem. O projeto do Google, por exemplo, de construir um computador Quântico com correção de erros (termo usado por eles) é de que a máquina chegue ao mercado até o fim da atual década, voltada para serviços de Cloud.

“Tanto o Google quanto a IBM são provedores de execução e acreditam que a Computação Quântica será algo na Nuvem, onde é possível acessar e usar. Mas esse ainda é um cenário que pode ou não acontecer, ou apresentar variações. Tudo depende da evolução tecnológica desses dispositivos. Então, teremos provedores de Nuvem oferecendo esse tipo de serviço, assim como poderemos ter computadores Quânticos dentro das empresas”, aponta Genaro Costa, líder das Práticas de Automação, IA, Analytics e IoT da Atos para América do Sul, que acredita que será possível ver computadores Quânticos nas universidades brasileiras na década de 2030.

De concreto, há dois anos, o Google anunciou em artigo na revista Nature que sua máquina Quântica  tinha resolvido em 200 segundos um cálculo de teste que um supercomputador clássico levaria milhares de anos para executar. Esse salto no processamento abre a possibilidade de um número quase infinito de aplicações a partir dos bits quânticos, ou qubits, que podem operar com um emaranhado de informações.

Centros de pesquisas
Em maio deste ano, a equipe do Google AI Quantum – criada em 2007 – se mudou para um novo campus em Santa Barbara, Estados Unidos, onde está instalado o primeiro Data Center Quântico da companhia. No local, estão ainda os seus laboratórios de pesquisa de hardware Quântico e instalações de fabricação de processadores Quânticos.

As pesquisas dos mais diversos segmentos serão celeradas e se tornarão mais assertivas

No Brasil, a Atos, em parceria com o Senai Cimatec, instituição de educação, pesquisa e inovação, lançou seu primeiro centro de excelência em Computação Quântica dedicado ao setor empresarial em abril deste ano, o Latin America Quantum Computer Center – Laqcc, localizado em Salvador, BA. Seu objetivo é impulsionar a capacitação de mão de obra e incentivar pesquisas científicas nas mais diversas áreas, como Química e Biologia.

A ideia é que o Laqcc seja capaz de realizar estudos de impacto, roadmaps tecnológicos, investigações de algoritmos e projetos de pesquisa aplicada. “Este centro é resultado de uma sólida relação de confiança entre a Atos e o Senai. Juntos, ajudamos a posicionar o Brasil como uma das nações com poder em supercomputação. Agora, demos um passo importante para impulsionar a Computação Quântica no mercado brasileiro”, projetou Nelson Campelo, CEO da Atos na América do Sul.

O centro, de acordo com Luis Casuscelli, diretor de Big Data e Security da Atos, é uma resposta à requisição do mercado por soluções de Computação Quântica. “As pesquisas dos mais diversos segmentos serão aceleradas e se tornarão mais assertivas, um avanço possível por conta da integração entre a tecnologia Quântica e os supercomputadores”, aponta. Ele lembra que, no cenário atual, a demanda por maior desempenho tem atingido os limites da TI convencional.

Junto com o Laqcc, os parceiros também lançaram o Quantum Learning Machine – QLM, um simulador que permite a criação de algoritmos Quânticos de grande capacidade, agnóstico às implementações reais, que será utilizado pelo Cimatec no desenvolvimento de pesquisas.

O mundo das aplicações
Ainda falando de Brasil, o setor de TI avalia que a Computação Quântica deve ser utilizada em aplicações complexas, como as da indústria de petróleo, por exemplo. “Uma empresa petroleira poderia usar a Computação Quântica na prospecção de novas bacias, analisar sua capacidade e reduzir os custos e riscos operacionais. Ou uma companhia do setor bancário, que poderia usar a sua capacidade computacional na otimização de portfólios e análise de riscos sistêmicos com simulações de mercado”, argumenta Bruno Domingues, da Intel.

Também de olho nas aplicações, a Microsoft desenvolveu o Microsoft Quantun, um ecossistema de Computação e otimização Quântica de Nuvem aberta, que conta com soluções de parceiros, recursos de aprendizado para desenvolvedores, pesquisadores e alunos. “Acreditamos que a Computação Quântica precisa ser estável, escalonável e acessível e, para isso, criamos avanços em todas as camadas da plataforma, incluindo programas de software, aplicativos, dispositivos e controles que estão disponíveis neste ecossistema aberto”, explica Fernando Lemos, vice-presidente de Tecnologia, Inovação e Sucesso do Cliente da Microsoft Brasil.

Alguns fornecedores planejam fornecer a Computação Quântica como um serviço na Nuvem

É a partir deste ecossistema que a Microsoft acredita ser possível acelerar o desenvolvimento e o crescimento da Computação Quântica, uma vez que ele conta com soluções pré-construídas, que garantem um rápido desenvolvimento. “As soluções são customizadas e preparadas tanto para integração quanto para submissão de Dados. Assim, o processo de desenvolvimento otimizado com o Azure Quantum garante economia de custos a médio e longo prazos”, argumenta Lemos. Dentre os parceiros estão a Honeywell, Ionq, Quantum Circuits, 1QBit e a Toshiba.

Como complemento, a Microsoft lançou um kit de Desenvolvimento Quântico, que possibilita aos desenvolvedores construírem algoritmos a partir da linguagem Quântica Q#, criada pela companhia. Com as aplicações podendo ser testadas em simuladores locais, como notebooks ou desktops, com até 30 qubits lógicos de potência para os circuitos quânticos, ou ainda via Microsoft Azure, com potência próxima de 40 qubits.

A segurança
O ecossistema da Microsoft chega até o apoio aos projetos com universidades e cientistas de Segurança na definição de novos algoritmos chamados Quantum-safe com participantes da competição mundial sendo promovida pelo National Institute of Standards and Technology – Nist, desde 2017.

Neste mesmo terreno, a Intel afirma que a Computação Quântica está presente direta ou indiretamente em quase tudo que a companhia desenvolve hoje, especialmente vislumbrando as mudanças na Segurança da Informação. “Pense que muitos equipamentos que compramos hoje estará operacional quando computadores Quânticos estiverem disponíveis e capazes de quebrar a criptografia tradicional. Já avaliamos a Segurança dos equipamentos levando em conta o mundo Quântico, que tem capacidade suficiente para quebrar chaves criptográficas em tempo razoável”, aponta Bruno Domingues, da Intel.

Claro que há controvérsias nesta questão. “O computador Quântico que vai quebrar nossas chaves atuais ainda não apareceu. Pode ser até que essa máquina chegue ao mercado em alguns anos, mas os desafios da Computação Quântica para a criptografia farão parte da história e do passado”, garante Roberto Gallo, CEO da Kryptus, especializada em Criptografia e Segurança Cibernética.

Oportunidades para integradores
Com a Computação Quântica batendo à porta, discute-se como o Canal, em particular os integradores, vão surfar nessa onda. É consenso que eles devem buscar uma forma de entrar nesse ecossistema para que participem da corrida por aplicações inovadoras ou extremamente complexas que possam fazer sentido na nova arquitetura.

“Se os supercomputadores já são realidade em muitas empresas, a Computação Quântica não está muito distante. Claro, ainda temos uma caminhada para que tudo seja perfeito. Mas caso alguma empresa pense em começar somente quando a Computação Quântica já estiver estável, além de pagar mais caro, terá uma grande curva de aprendizado que pode levar alguns anos”, alerta Costa, da Atos. O mesmo pensamento deve fazer parte do planejamento dos integradores.

Para Takaoka, da Fujitsu, os integradores mais especializados, principalmente focados em serviços envolvendo aplicações complexas, podem se capacitar para fazer parte do ecossistema de fornecedores. “O leque de conhecimento passa por pesquisa operacional avançada, matemática, física e estatística, e os profissionais que tenham conhecimento das áreas de negócios são os mais requisitados, pois podem ter os insights de forma muito mais assertiva”, admite.

Startup made in Brazil
São poucas as startups brasileiras voltadas para Computação Quântica. Uma delas é a Dobslit, que iniciou as atividades nesse ano. Formado por Carlos Speglich e por Rogerio Ruivo, conta ainda com a colaboração do Prof. Dr. Celso J. Villas-Boas, docente da Universidade Federal de São Carlos, SP.

A empresa desenvolve serviços de Computação Quântica para empresas, nos quais indústrias do setor Elétrico, Segurança da Informação, Financeiro, dentre outras, podem se beneficiar. “Nosso trabalho é realizar um inventário em cada empresa, normalmente junto ao setor de P&D ou inovação, para descobrir processos e oportunidades de implementar os algoritmos que rodam nos computadores Quânticos já existentes, criando aplicações criativas”, comenta Ruivo.

Para Eduardo Cicconi, gerente do Supera Parque, onde está a Dobslit, a startup é uma iniciativa importante para o parque tecnológico. “Estamos orgulhosos por apoiar, com nosso programa de membership, o projeto que tem uma tecnologia com potencial de revolucionar processos nas empresas”, finaliza.

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