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Importações desafiam as empresas

O uso cada vez mais intensivo de ferramentas digitais está dinamizando as atividades importadoras da área de TI, ajudando-as a mitigar um sem-número de entraves burocráticos, fiscais e conjunturais. Atores desse segmento examinam a conjuntura econômica e abordam questões legais, regulatórias e de logística

Importações desafiam as empresas

Não são poucos nem pequenos os percalços enfrentados hoje pelos importadores de bens e componentes de TI no Brasil. Carga tributária elevada, excesso de burocracia, complexidade operacional e as drásticas sequelas da pandemia destacam-se entre as injunções que vêm marcando as atividades do setor. É neste cenário desafiador que a Transformação Digital vem exercendo um papel decisivo na aceleração dos negócios, com a emergência de um diversificado arsenal de soluções e serviços.

Entrevistados por Infor Channel, executivos e especialistas da área colocaram sob exame a conjuntura econômica atual, explicitando as principais dores sentidas pelos importadores, dos pontos de vista legal, regulatório e de logística. Ao mesmo tempo, apontam as principais alternativas tecnológicas que vêm sendo aplicadas no dia a dia para ajudar as empresas a contornar os obstáculos encontrados.

Blockchain está apto para uso neste segmento já há algum tempo

“O Brasil ainda possui muitos entraves para as importações, considerando, em primeiro lugar, que temos uma das maiores cargas tributárias do mundo, incidindo tanto nas compras externas quanto nas vendas de produtos”, atesta, de saída, Bruno Rigatieri, diretor de Compras da WDC Networks.

Hoje, avalia o executivo, o País, assim como boa parte dos países do Mercosul, apresenta uma tarifa média de importação para bens industriais de duas a três vezes maior do que se contabiliza em países ricos e emergentes. Esta taxação acaba afetando diretamente o preço final de venda dos produtos no mercado interno.

A complexidade das operações de importação no Brasil é outro tema levantado por ele: “Além de existirem milhares de classificações e subclassificações fiscais, os processos relativos a portos de descarga, presença de cargas e liberação alfandegária acabam gerando diversos custos”.

Batendo na mesma tecla, Daniel Torres, gerente de Divisão Transacional da SND, também entende que as operações de comércio exterior no Brasil, sob a óptica legal, são bem complexas, pois a todo momento aparecem novas normatizações, que em sua maioria, segundo ele, são interpretativas, ou seja, causam incertezas sobre a forma correta de nacionalizar um determinado componente de TI. “Surgem assim grandes diferenças de preços de um importador para outro, pois, dependendo do entendimento dessas normativas, o reflexo vem no percentual de recolhimento dos impostos de nacionalização”, afirma.

Em menos de cinco anos, teremos um cenário completamente digitalizado para o comércio exterior

A legislação brasileira, prossegue, deveria ser simplificada no que diz respeito à classificação, ao enquadramento e nomenclaturas – como no caso da Nomenclatura Comum do Mercosul – NCM, diminuindo assim os riscos de erros na hora de catalogar um produto ou componente. Estas falhas, adverte o gerente, acarretam descontrole e variação de preços praticados em diversos importadores para o mesmo produto.

Nesse sentido, os distribuidores de tecnologia no Brasil, representados pela Associação Brasileira da Distribuição de Tecnologia da Informação –Abradisti, têm trabalhado em parceria com outras instituições para apresentar laudos técnicos para as autoridades, a fim de padronizar a classificação de alguns produtos e componentes.

Fortes golpes
Sob o aspecto macroeconômico, Nathalia Amorim, especialista de Comércio Exterior da eComex NSI, lembra que, desde o início da pandemia em 2020, os intercâmbios internacionais vêm sofrendo duros golpes. “Claro que o cenário trouxe efeitos negativos para todos os setores de uma forma geral, mas quando nos aproximamos de dois anos de catástrofe sanitária, o comércio exterior e a logística internacional ainda passam por uma profunda crise e sem expectativa de término”, enfatiza.

Outros vetores tiveram desdobramentos igualmente adversos: a carência de insumos e de equipamentos de contêineres – iniciada na Ásia e posteriormente com reflexos no restante do mundo; o aumento exponencial dos custos de frete, principalmente marítimo; o intenso congestionamento dos portos devido às medidas de restrição; a redução na oferta de rotas e embarcações; e a desaceleração na atividade industrial, por conta dos lockdowns e também pela falta de mão de obra devido à disseminação da Covid-19.

O novo comportamento veio para ficar

“Tudo isso gerou uma reação em cadeia, atrasando linhas de produção, pedidos e entregas, afetando diretamente o atendimento ao cliente e as demais demandas e contratos. Para o setor de Tecnologia não foi diferente – todos esses entraves impactaram as nossas entregas”, observa Nathalia.

Sem expectativa para o encerramento da crise, o grande desafio para todos os importadores é planejar ao máximo as suas operações e os seus custos, para que seja possível sobreviver e manter clientes, mesmo diante de todos os atrasos e variações de preços.

Também conferindo centralidade aos desdobramentos da pandemia, Israel Ferreira, coordenador de Technology Business da Asia Shipping, pondera que as incertezas originaram problemas, mas ao mesmo tempo, aceleraram mudanças de comportamento que estavam previstas para somente daqui a cinco ou dez anos. Com o lockdown, analisa, muitas empresas cancelaram seus pedidos de produtos, peças e componentes para as fábricas, esperando pelo pior. Porém, na prática, ele contrapõe, o consumidor caminhou em outra direção, elevando a demanda, o que pegou todos de surpresa.

“Tivemos a mudança no perfil de compras para o formato de e-commerce, que foi acelerado em 2020, acusando um aumento de aproximadamente 74%. Neste ano já registramos crescimento de 24% no primeiro semestre, o que mostra que o novo comportamento veio para ficar”, sublinha Ferreira. Tendo em vista esta reviravolta, ele faz menção a três barreiras com que os importadores vêm se deparando desde o ano passado.

Estoques insuficientes nos fornecedores é a primeira. Em meio ao cancelamento dos pedidos, num primeiro momento, até a retomada em período de isolamento, houve um backlog gigantesco, devido ao qual até hoje os importadores não sabem para onde correr. O dado mais impactante é a falta de microchips, componentes já escassos mesmo antes da pandemia. Há ainda outros fatores como a seca em Taiwan e um incêndio que destruiu a maior fábrica de microcontroladores automotivos do mundo, sediada no Japão.

A segunda é a falta de espaço no transporte internacional. Com a demanda acima da capacidade do mercado, embarcar cargas nos navios tornou-se quase uma batalha diária para os importadores, além do preço do frete, que atinge marcas históricas. Como se não bastasse, eles têm que lidar com a falta de contêineres na China.

Logística não digitalizada é a terceira barreira, já que o aumento exponencial do Comércio Eletrônico exige também uma cadeia inteira digitalizada, englobando internamente parceiros e outros intervenientes da logística. “O varejo estava esperando esta expansão somente mais para frente, o que fez que muitas empresas que não digitalizaram seus processos ficassem para trás, perdendo market share”, nota o coordenador da Asia Shipping.

Mais agilidade
Para amenizar os efeitos destes revezes e aquecer as atividades das empresas e do segmento, o uso intensivo de ferramentas digitais, conforme o relato dos especialistas, vem exercendo um papel crítico.

De modo geral, a pandemia, em que pesem as sequelas nefastas, acabou beneficiando o setor ao induzir o crescimento do teletrabalho e das operações online. “A tecnologia nunca foi tão aliada do comércio exterior como atualmente, ajudando a impulsionar, de forma muito mais rápida do que o esperado, a digitalização e modernização de diversos processos”, explica Nathalia, da eComex NSI.

As operações de comércio exterior no Brasil, sob a óptica legal, são bem complexas

Em um futuro próximo, ela prevê que todas as empresas, na prática, serão de TI, pelo fato de todas as suas atividades estarem diretamente ligadas ao manuseio de ferramentas digitais. “Para importadores não será diferente, principalmente se desejamos colocar o Brasil em um patamar melhor frente ao mercado mundial. A tecnologia será utilizada por todos, auxiliando diretamente a otimizar tempo, custos, pessoas, previsões, entre outros pontos”, afiança ela.

Por sua vez, Rigatieri, da WDC, julga que o aporte tecnológico está sendo crucial para o aperfeiçoamento da gestão e da performance de todas as organizações deste ramo. Hoje, há diversas empresas com programas de gerenciamento e análise de dados, tais como volumes importados e médias de fretes por região, entre outros indicadores-chaves. “A contratação destas soluções de TI nos permite levantar informações mais realistas para alinhar nossas estratégias internas e nos adaptarmos e anteciparmos às mudanças”, garante.

Com a recente escalada de custos dos fretes internacionais, a WDC, por exemplo, emprega ferramentas digitais de Supply Chain para arregimentar estes serviços. “Essa providência nos ajudou a aumentar a gama de fornecedores, facilitando a busca de melhores preços e condições comerciais, além de aumentar nosso compliance quanto a essas contratações”, frisa Rigatieri.

No entender de Torres, da SND, a digitalização está contribuindo para que a área importadora possa, em especial, reduzir as complexidades ligadas à classificação de produtos no momento de uma compra externa.

“Posso citar a Inteligência Artificial, que já ajuda muitas empresas a terem uma análise minimamente qualificada, dando segurança nas transações. A solução funciona com um sistema conectado globalmente, que automatiza as operações, diminuindo custos e garantindo maior conformidade com a legislação, sendo segura e assertiva em termos de efetividade e obtenção de resultados”, descreve o gerente da Distribuidora.

Ao ressaltar que a disrupção digital é, nos dias atuais, uma condicionante para empresas crescerem de forma escalável, Ferreira, da Asia Shipping, destaca a necessidade de aculturar o mercado para adesão a esta nova realidade emergente.

“Acredito que nunca houve tantas opções de sistemas e serviços disponíveis, difundidas por meio de webinars e treinamentos nas redes sociais. Muita gente tem um problema, mas não sabe qual solução digital pode resolvê-lo, dentre tantas opções. A resistência cultural ainda existe, apesar de menor do que no passado, pois a necessidade de transformação se sobrepõe ao medo da mudança”, finaliza.

♦ Blockchain conquista espaço
Algumas soluções tecnológicas específicas estão despontando hoje no suporte ao comércio exterior, facilitando o dia a dia das operações e da gestão dos processos de negócios. Ouvidos por Infor Channel, os especialistas comentam as mais relevantes.

A tecnologia Blockchain, de imediato, vem ganhando maturidade, abrindo espaço para diversas aplicações nos mais distintos nichos da economia. A juízo de Daniel Torres, gerente de Divisão Transacional da SND, ela vive um verdadeiro processo de desmitificação, tornando-se uma realidade não somente no domínio das transações financeiras.

“É uma tecnologia com sistema de rede segura e distribuída, que permite o compartilhamento de informações-transações ao redor do mundo através de uma cadeia de blocos. Dessa maneira, elas ficam registradas de forma vitalícia, disponíveis e auditáveis, facilitando o rastreamento e a identificação”, descreve.

Embora seja ainda pouco explorado no comércio externo, Blockchain está apto para uso neste segmento já há algum tempo, complementa Israel Ferreira, coordenador de Technology Business da Asia Shipping: “Ele pode acelerar muito a transferência de documentos e outros assets digitais na área, de maneira rápida e segura”.

Portal Único – Projeto criado pela Receita Federal, em associação com a Secretaria do Comércio Exterior, que reformula todos os processos de importação, exportação e trânsito aduaneiro. Propicia melhor fluidez e maior velocidade nos processos, com menor ocorrência de imprevistos. Nesse portal é possível encontrar informações oficiais sobre normas, exigências e procedimentos que cercam o comércio exterior brasileiro.

Smart Packing – Esta inovação poderá também ser popularizada em breve. Com a queda do preço do sensor para Internet das Coisas, IoT, para centavos de dólar, torna-se mais fácil conectar caixas, oferecendo maior possibilidade na automação do estoque.

Torre de controle – Tecnologia que automatiza os processos logísticos como um todo, com capacidade de abordar de forma precisa e detalhada todos os intervenientes que determinam o funcionamento das operações, como transportadoras, fretes e frotas, entre outros.

Conectividade B2B e a gestão da cadeia de suprimentos – Já existem empresas no mercado que oferecem serviços terceirizados na área, totalmente digitais, para que o importador consiga acelerar as implementações.

♦ As inovações e a agregação de valor às atividades
Os resultados do processo de digitalização das operações de importação estão longe de se ater à mera contenção de custos. Na verdade, os múltiplos benefícios trazidos incluem ganhos de eficiência, desburocratização, melhora na logística, gestão e mitigação de riscos mais efetivas, para citar alguns. Em poucas palavras, trata-se efetivamente de agregar valor aos negócios por meio de inovações.

A transformação em andamento se torna mais notável quando se conhece o histórico de atraso tecnológico desta seara de atuação. Nathalia Amorim, especialista de Comércio Exterior da eComex NSI, lembra que este é um segmento tradicionalmente marcado por processos burocráticos e engessados. No entanto, ao longo dos anos esse perfil vem se modificando, em linha com o avanço da tecnologia e da globalização. “Manter-se estático, principalmente no mundo atual, é uma tática suicida para os negócios”, salienta.

O grande desafio para todos os importadores é planejar ao máximo as suas operações e os seus custos

“Se desejamos que o comércio exterior brasileiro alcance níveis mais competitivos em escala mundial, precisamos investir na desburocratização dos processos, ganhar agilidade e acurácia e reduzir os riscos das nossas operações. Para isso, é fundamental que importadores e demais agentes estejam aptos a inovar em seus processos internos também”, situa Nathalia.

A saída, em outros termos, é ter a tecnologia como aliada, planejar-se e atentar para todas as mudanças que estão batendo à porta. “Não podemos negar que, em menos de cinco anos, teremos um cenário completamente digitalizado para o comércio exterior e um importador que não se adequar ao novo modelo não vai sobreviver ao mercado”, arremata a especialista.

Para Israel Ferreira, coordenador de Technology Business da Asia Shipping, o fim de toda a ‘corrida’ pela transformação digital é a escalabilidade. Deste modo, se hoje há demanda, o grande desafio de todo empresário é atendê-la de forma rápida, com o menor custo possível e com um crescimento sustentável.

“A digitalização da empresa traz uma série de resultados, mas talvez o mais valioso deles seja a informação. Uma vez que todos os dados estejam online, é possível organizar, estruturar e transformar estes dados em informações, com ajuda de um analista”, sugere. A partir daí, o gestor pode começar a tomar decisões baseadas em números mais concretos, e menos no feeling, além de ter a possibilidade de enxergar sua cadeia logística com um ângulo de 360 graus, verificando onde estão os gargalos e onde é possível economizar. “A meta é gastar energia onde ela realmente precisa ser gasta”, resume Ferreira.

Indo mais a fundo, o especialista da Asia Shipping preconiza a maior integração do comércio exterior às cadeias de valor das companhias: “Muitos dos importadores ainda colocam esta área à parte, de modo que vários sistemas de gestão empresarial não têm integração com os dados dela, os quais acabam ficando em planilhas, alimentando o ERP em outro momento”.

O primeiro passo que o importador pode dar, recomenda Ferreira, é mapear sua cadeia e entender quais eventos ainda são preenchidos manualmente e quais ainda não estão em seu sistema. “Com essa visão, a empresa pode já buscar uma ferramenta e parceiros para acelerar a digitalização”, conclui.

Num balanço final, Bruno Rigatieri, diretor de Compras da WDC Networks, afirma que ainda existem muitos desafios para tornar a operação de importação mais fácil e com menos riscos: “À medida que as tecnologias vão barateando e se disseminando, fica mais fácil a adoção delas para o processo completo”.

Na realidade, de acordo com o diretor, para se tirar proveito de tudo que está disponível, é necessário digitalizar todos os processos. “Dessa forma conseguiríamos utilizar recursos como Inteligência Artificial para conectar transportadores com a liberação da carga, ou a tecnologia de Blockchain para a realização de transações financeiras entre importadores e agentes de cargas”, ilustra.

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