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Área pública: desafios e lucros

A jornada de Transformação Digital – sempre ela atualmente, tem contribuído para incrementar a contratação de bens, serviços e soluções para atender às necessidades de órgãos e autarquias governamentais, tradicionais compradores de TIC e alvo de cibercriminosos

Área pública: desafios e lucros

Em meio a uma jornada de Transformação Digital, o setor Público desenvolve projetos de modernização que demandam altos investimentos em Tecnologia da Informação e Comunicações, TIC. A busca por soluções e serviços de ponta que visam a melhoria do atendimento aos cidadãos e a eficiência do processo de compras públicas tende a incrementar os negócios dos fornecedores que têm nas três esferas de governo uma de suas principais fontes de receita.

O governo é um dos grandes consumidores de recursos de TI, conforme levantamento da Effecti, uma startup de tecnologia que desenvolve plataforma para licitantes com soluções inteligentes, incluindo Automação de Processos. Tomando como base os contratos públicos divulgados no Portal Transparência e Diário Oficial da União, a empresa constatou que as contratações realizadas no ano passado totalizaram R$ 2,5 bilhões, pouco acima do volume de R$ 2,1 bilhões desembolsado no exercício anterior. Os valores relativos a 2021 também são expressivos: somente em julho, por exemplo, o valor pago aos fornecedores chegou a R$ 367 milhões.

Uma série de medidas recentemente adotadas podem contribuir para estimular o apetite governamental para a contratação de recursos de TI. No que diz respeito ao atendimento ao público, por exemplo, Fernando Salla, CEO da Effecti, destaca a Medida Provisória 961, editada em 2020, que flexibilizou as negociações com foco no suporte à área de Saúde, e o pagamento do Auxílio Emergencial.

Na parte que envolve a melhoria dos processos internos, cita a ampliação do alcance do pregão eletrônico. Promulgada em abril deste ano, a nova Lei de Licitações (13.433) prioriza a adoção desse formato nas aquisições que atualmente são realizadas de forma presencial.

O executivo da Effecti ressalta, ainda, que o governo adotou a estratégia de compra conjunta, com o objetivo de trazer mais eficiência nos gastos. Citando dados divulgados pelo Ministério da Economia, diz que o procedimento garantiu em 2020 uma economia de R$ 515 milhões na aquisição de notebooks, desktops e monitores e de R$ 10,2 milhões na compra do pacote Office 365, da Microsoft. “O governo estuda a ideia de criar um marketplace para compras públicas, algo que mudará a lógica e velocidade de contratação”, acrescenta Salla.

Os serviços que contemplam a consultoria técnica, o desenvolvimento e manutenção de software e a segurança das informações sensíveis, que cada vez mais estarão disponíveis online tendem a puxar a demanda do setor Público na área de TIC nos próximos anos. Isso porque existe ainda um longo caminho a ser percorrido para a modernização e a digitalização dos serviços oferecidos pelas três esferas de governo. Na avaliação de Salla, esse avanço tecnológico exigirá muitas horas de desenvolvimento de softwares especializados e implementação de infraestrutura adequada para suportar a demanda.

Serviços de consultoria técnica, desenvolvimento e manutenção de software e a Segurança das informações sensíveis tendem a puxar a demanda do setor Público  

No quesito Segurança, os números impressionam. De acordo com estudo da Trend Micro, fornecedora mundial em soluções de cibersegurança, os segmentos mais atingidos, em todo o mundo, em 2019 e 2020, foram os de Manufatura, Governo, Educação e Saúde. Estes quatro setores, somente no ano passado, responderam por mais de mais de um milhão, 463 mil detecções.

No Brasil, o setor governamental é o principal alvo dos cibercriminosos. O estudo revela que o segmento ocupa a primeira posição nos últimos dois anos, sendo com 40% dos ataques em 2019, e 35,3% das ameaças bloqueadas em 2020, mais do que o triplo de detecções em relação ao segundo colocado.

Só neste ano, de janeiro a maio, a Trend Micro contabilizou quase cinco milhões e meio de empresas atacadas em todo o mundo; a área de manufatura permanece na liderança do cenário global (20,6%) e no Brasil, o governo, com 35,7%. “Os executivos de TI da área pública precisam investir nas mudanças para arquiteturas modulares e modernas”, aconselha Renato Tocaxelli, gerente Regional de Conta da companhia e especialista em setor Público.

Desafios na contratação
O setor Público tem particularidades que tornam desafiadora a tarefa de suprir as suas demandas. Por exemplo: o ciclo de maturação do negócio costuma ser mais longo. “A quantidade de exigências do modelo atual de contratação muitas vezes impede que o governo seja tão ágil quanto uma empresa privada”, observa Elisângela Morgado, diretora de Vendas de Setor Público da HPE.

Um cenário de alta do dólar e de falta de insumos no mercado, como o atual, pode elevar os preços das soluções para além do orçamento previsto, resultando muitas vezes no cancelamento ou na prorrogação do processo de licitação.

A desatualização tecnológica da solução adquirida é outra consequência do tempo que transcorre entre a realização do processo licitatório e o efetivo cumprimento do contrato. O risco existe por conta, principalmente, do modelo de aquisição de ativos como investimento (Capex), predominante nos contratos firmados na esfera governamental. Contudo, os fornecedores acreditam que pode ser mitigado com a contratação dos ativos como serviço, as a service, no qual as atualizações tecnológicas e o suporte técnico das soluções customizadas já estão previstas em contrato e são de responsabilidade do fornecedor. Nessa modalidade, o desembolso do dinheiro, feito com base no consumo, entra na rubrica custeio.

Ainda pouco difundido na esfera pública, o modelo as a service endereça outras questões relevantes para o Setor. Como exemplo, Luiz Cláudio Félix, gerente de Vendas para o Governo da Microcity, destaca o aspecto econômico: “o investimento geralmente bilionário feito nas compras pode ser diluído ao longo dos exercícios financeiros. Uma vantagem é a economia proporcionada”. Segundo ele, nos contratos desse tipo firmados com órgãos federais e Estados, a companhia tem observado uma economia de aproximadamente 30%.

A redução da quantidade de interlocutores com os quais os órgãos públicos se relacionam comercialmente é outro aspecto positivo.

Félix explica que, normalmente, os órgãos públicos mantêm contratos distintos para o fornecimento de hardware, de software e de suporte técnico. No modelo como serviço é possível firmar um único acordo abrangendo os três itens, o que proporciona mais eficiência na gestão dos ativos de TI. “Se houver algum problema na máquina ou no software, o cliente não precisa entrar em contato com o fabricante. Basta acionar a empresa contratada para fornecer a solução”, afirma.

As contratações realizadas no ano passado totalizaram R$ 2,5 bilhões, acima do volume de R$ 2,1 bilhões desembolsado no exercício anterior  

Arcabouço legal
Avanços na legislação têm o potencial de mudar a dinâmica das compras neste segmento. O governo Federal, por exemplo, está consolidando processos de contratações com a criação de Atas de Registros de Preços, que inclui diversos coparticipes. Fábio Mucci, líder de Ecossistemas e Parcerias para o Governo da IBM, cita a Lei 13.303/16, que suporta contratos de colaboração para oportunidades de negócios. “Cada empresa pública, seguindo as orientações da lei, define as regras que vai observar para firmar parcerias”, explica.

Por outro lado, é grande a expectativa com o fim da vigência da Lei 8.666/93 que, na avaliação dos fornecedores de TI, funciona como uma barreira para o avanço da oferta como serviço. Elisângela, da HPE, revela que vários processos de contratação baseados neste modelo já foram barrados pelo Tribunal de Conta da União, TCU, entre outros motivos, pela dificuldade de se comprovar a transparência do processo. É muito difícil, por exemplo, medir se o pagamento que está sendo efetuado corresponde exatamente ao que foi contratado.

Por enquanto, as Leis 8.666/93 e 13.433/21 conviverão por dois anos. Durante esse período de transição, o órgão público poderá escolher qual das duas regerá as contratações de bens e serviços, inclusive de TIC. O que se espera é que, com a nova lei, fornecimentos baseados na oferta como serviço ocorram de uma forma mais natural. Isso porque traz normativas que priorizam atos digitais, permitindo sua produção, comunicação, armazenamento e validação por meio eletrônico.

Que os processos de aquisição de bens e serviços de TIC no setor precisam ser mais rápidos e menos custosos ninguém duvida.

Entretanto, Herbert Azevedo, diretor Comercial para o setor Público da Logicalis, considera prematuro avaliar os reais impactos da nova Lei de Licitações. “Ainda teremos uma curva de aprendizado”, ressalta.

O sentimento que paira no mercado é o de que a nova lei reforça os instrumentos de controle dos gastos públicos, estimula o planejamento orçamentário, promove um ambiente competitivo e elimina a burocracia da contratação de bens e serviços pelo Setor Público, que tem como principal missão primar pelo bem-estar social, provendo e gerindo, de forma integrada, soluções em gestão, para a excelência do serviço prestado à população.

Uma de suas novidades é o modelo de contratação via o Diálogo Competitivo, para o qual pode haver não apenas alguma simplificação, mas principalmente agilidade em processos voltados à inovação tecnológica.

Um bom negócio
Vender para o governo tem sido um bom negócio. Do contrário, não seria grande o número de fornecedores que participam das licitações. Para Elder Jascolka, diretor-geral da Veeam Software, uma empresa interessada em operar no Brasil não pode abrir mão dessa fatia do mercado. “Existem órgãos federais com estruturas semelhantes às de grandes empresas globais”, justifica, citando como exemplos o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. O executivo calcula que o governo representa em torno de 40% da receita das empresas de TI.

Na condição de grande consumidor de soluções e serviços de TI, o setor Público oferece boas oportunidades de negócios. Mas fazer parte do time de fornecedores desse rico filão do mercado requer muito além de capacidade técnica, soluções de qualidade, preços competitivos e uma boa estrutura de atendimento. Na avaliação de Jascolka, ter musculatura financeira conta muito porque, dependendo do contrato, um atraso no pagamento pode representar problemas no fluxo de caixa da empresa fornecedora.

Por enquanto, as contratações governamentais representam 20% dos negócios da Veeam, que atua nesse mercado via o Canal de distribuição. Para atingir a meta de dobrar essa participação, a companhia decidiu ampliar a sua estrutura de vendas, trazer profissionais com mais experiência no atendimento desse tipo de cliente e capacitar os parceiros de vendas. Desde março funciona o programa Veeam Cloud; Service Provider, VCSP, de certificação dos Canais que atuam na vertical governo. Atualmente, conta com 30 participantes, que fazem negócios acima de R$ 50 mil com este Setor.

Por sua vez, a Microcity estabeleceu como meta firmar R$ 40 milhões em contratos com o governo até o final do ano, o que permitirá dobrar a participação dessa vertical na sua operação, que é de 20%. A meta, que está bem próxima de ser atingida, exigiu uma reestruturação do departamento que cuida dessa área de negócio.

O time de colaboradores especializados para suprir as demandas específicas dos clientes nas esferas municipal, estadual e federal foi ampliado em 30%. Além disso, a companhia renovou as certificações de qualidade e tecnicidade juntos aos principais fabricantes de soluções de TI com os quais trabalha e obteve o selo CertGov, que comprova a integridade dos processos, a aderência às práticas antissuborno e anticorrupção.

Fornecedora de soluções que abrangem desde equipamentos e serviços de missão crítica agregados até soluções de conectividade para a borda, a HPE tem uma atuação focada nas esferas federal e estadual. A companhia, que não revela a quantidade e o valor dos contratos em carteira, diz que este Setor representou aproximadamente 40% da sua operação no ano fiscal de 2020. A expectativa é de incremento dos negócios em 2021 por conta das inúmeras licitações que estão em andamento. Segundo Elisângela, no período entre julho e outubro ocorre a maior parte das contratações porque a lei obriga que o orçamento deve ser executado dentro do ano fiscal em que foi alocado, que termina em 31 de dezembro.

Demandas em alta
Dois temas tendem a dominar a agenda de modernização tecnológica do setor Público. Em segurança, por exemplo, ainda há muito a fazer em relação à Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD. Além disso, o assunto Segurança Cibernética continua sendo relevante, atesta Herbert Azevedo, diretor Comercial para o Setor Público da Logicalis.

Em relação à Computação em Nuvem, diz que já se observa um processo de migração das aplicações para a Nuvem, seguindo uma tendência iniciada há algum tempo no setor Privado. “Para esses casos, a Logicalis tem feito grandes investimentos na capacitação de seus profissionais, no estabelecimento de novas parceiras e na aquisição de empresas”, ressalta.

Ainda pouco difundido na esfera pública, o modelo as a service endereça outras questões relevantes para o Setor 

Com clientes nas esferas municipal e estadual, a Minsait espera que a demanda do setor Público por produtos e serviços de TI continue aquecida nos próximos anos. De acordo com Miguel Rábano, líder de Governo e Saúde da companhia, uma tendência é a busca por soluções de Segurança Cibernética, Inteligência Artificial e serviços de Terceirização de Processos de Negócios – BPO, além de projetos de cidades inteligentes e de robotização. “Estamos preparados para atender a essa demanda aqui no Brasil”, salienta.

A pandemia do novo Coronavírus serviu de alavanca para a digitalização dos serviços públicos. O desafio é avançar nesse processo. De acordo com Mucci, da IBM, o governo federal tem a meta de digitalizar a totalidade dos serviços públicos em 2022.

Significa que ainda há muito trabalho pela frente. “Não estamos falando somente de preparar a infraestrutura para a Nuvem, mas também de modernizar aplicativos e software internos para que possam ser migrados para a Nuvem”, ressalta.

Contratos assinados
O setor Público tem atraído grandes empresas privadas interessadas em explorar as boas oportunidades de negócios geradas pela necessidade de modernização tecnológica. Entretanto, são as empresas públicas que figuram na lista dos maiores fornecedores de soluções e serviços de TI.

Conforme levantamento da startup Effecti, os órgãos da administração federal assinaram 1.929 contratos de serviços de TI em 2020, totalizando R$ 2,5 bilhões. O valor foi 18,74% maior do que o volume registrado no exercício anterior: R$ 2,1 bilhões.

Dois grandes fornecedores do setor Público foram a Dataprev, que fechou 11 contratos em 2020, totalizando R$ 630 milhões, e o Serviço Federal de Processamento da Dados – Serpro, que recebeu R$ 217,9 milhões referentes a 59 contratos.

O maior contrato foi assinado em novembro do ano passado entre o Instituto Nacional de Seguro Social – INSS, e a Dataprev, no valor de R$ 519,6 milhões. Em segundo lugar ficou o acordo firmado em setembro entre o Ministério da Infraestrutura e o Serpro, de R$ 90 milhões.

Mas atender à demanda deste segmento não é uma primazia das grandes corporações. No ano passado, as microempresas fecharam 271 contratos na área, totalizando R$ 46 milhões.

Já as empresas de pequeno porte arrecadaram R$ 65 milhões em 360 contratos. Demais fornecedoras foram responsáveis por R$ 2,4 bilhões em vendas de produtos e serviços (valor dividido entre 1.298 contratos), correspondendo a 67% de todos os acordos fechados no ano.

 

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