Para muitas corporações, a vigência da LGPD pode incomodar em variáveis graus, que podem ser comparáveis no mínimo a um pedrisco no sapato, e no limite até a uma nevralgia. Em qualquer desses graus, é um problema que precisa de ação urgente por várias razões.
A primeira delas é porque de fato a lei é benéfica e muito importante, tanto para a nossa proteção como cidadãos, quanto para melhorar a conduta das nossas empresas. Por isso mesmo, não devemos perder tempo e rapidamente devemos nos adequar. Contudo, dependendo do trajeto escolhido, alcançar esse objetivo pode consumir muito tempo.
Repetindo: pode consumir muito tempo. Ou não.
A ocorrência de qualquer das hipóteses dependerá tanto da experiência do time que guiará a empresa nesse trajeto quanto dos métodos que esse time utilizará. Quem está no mercado sabe que nos projetos de adequação à LGPD as abordagens mais utilizadas estão baseadas em diagnósticos longos, com o envio de questionários frios e em geral ineficientes. Na verdade, eles fazem parte de uma sequência de ações que não deflagram o processo mais fundamental para a adequação da empresa à lei, que é a transformação cultural dos colaboradores.
Engana-se quem acha que essa transformação da cultura dos colaboradores, assim como dos processos e sistemas da empresa para adequação às exigências da lei, seja de responsabilidade do jurídico ou da área de TI. O que elas devem fazer é dar apoio às áreas de negócios, as verdadeiras responsáveis por essas transformações.
A primeira das transformações, e que traz benefícios a todas as áreas, é de fato não se perder tempo, adotando, para começar, uma postura ágil. Neste caso, essa postura significa o “fatiamento” da empresa em áreas organizacionais e elaboração de todo o ciclo, do diagnóstico à recomendação, em “sprints” com a duração de uma, até no máximo duas semanas, ao contrário das abordagens tradicionais, que consomem de dois a três meses (e transformam o projeto de adequação à LGPD no transporte de um piano de cauda).
Essa nova dinâmica integra ao projeto os profissionais da área de negócios, aproxima e sensibiliza os usuários, e também antecipa as ações de correção.
É uma prática que tem se mostrado muito efetiva na gestão da mudança, já que os colaboradores aprendem sobre a LGPD em reuniões de trabalho e nas discussões sobre a aplicação da lei à sua realidade de negócios – e não em treinamentos ‘passivos’ e monstruosamente ineficientes sobre os conceitos da lei.
Para favorecer esse aprendizado e ganhar tempo, é preciso fugir tanto do “juridiquês” quanto dos jargões de TI, já que as conversas entre as áreas serão povoadas de expressões e termos do dia-a-dia da empresa. O melhor será manter um vocabulário acessível e de negócios, traduzindo as leis e suas demandas para situações do cotidiano.
Outra estratégia vitoriosa da nossa abordagem é identificar todas as “personas” que têm dados transitando pelas áreas de negócios. Explicando melhor: por meio de entrevistas, identifica-se todos os tipos de pessoas físicas cujos dados de alguma forma são capturados pela empresa. Ao agrupá-los, damos a eles o nome de “personas”. Por exemplo: colaborador, prestador de serviços de transportes, freelancer, cliente, prospect, contato de empresa cliente, contato de fornecedor e assim por diante.
Mapeadas as “personas”, fica muito mais fácil também entender e mapear quais os dados capturados pela empresa, a base legal de apoio para essa captura, onde eles estão armazenados e sua jornada nos processos dentro da empresa. Só então se pode começar a falar de sistemas e de tecnologia.
Toda essa compreensão é que permitirá a elaboração de recomendações. Nesse intervalo, provavelmente a equipe ainda estará com os conceitos bem nítidos na memória e com alto nível de energia para trabalhar no projeto – o que não é esperado em soluções que demoram muito na fase de diagnóstico.
Claro que é importante abordar segurança da informação e cibersegurança. Embora esses temas não possam ser negligenciados, essa análise deve ser feita por uma frente de trabalho separada e focada nos executivos de TI. Não existe compliance com a LGPD sem uma proteção de perímetro, isto é, sem segurança da informação, proteção a servidores, dispositivos móveis e sistemas contra ameaças que põem em risco as informações processadas, armazenadas e transportadas por esses sistemas, ou seja, cibersegurança.
Como a lei determina que os sistemas devem estar “de acordo com as boas práticas” de tecnologia da informação, o diagnóstico durante os sprints poderá apontar a necessidade de outros projetos, eventualmente maiores, como a substituição completa de sistemas, que demandarão mais investimentos e outros prazos de implantação. Antes disso, porém, é provável que a grande maioria das oportunidades de mitigação de problemas seja obtida com pequenas mudanças de procedimentos ou revisões de contratos e políticas simples, e que poderão ser implementadas logo nas semanas seguintes ao sprint, permitindo que a empresa dê um salto em direção à adequação e evitando autuações.
Por Arlete Nascimento, consultora sênior da TGT Consult e DPO, e Omar Tabach, sócio da TGT Consult
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