book_icon

Mercado gamer: um nicho bilionário

A edição impressa de Infor Channel de janeiro-fevereiro de 2020 traz, entre outras reportagens de peso, um raio X do mercado de jogos
Mercado gamer: um nicho bilionário

Fabricantes, distribuidores e revendas aproveitam grande impulso do mercado brasileiro de games – que alcançou US$ 1,6 bilhão em 2018 e segue em linha crescente – para fazerem vendas qualificadas de equipamentos e periféricos. Qualidade dos produtos e tickets médios elevados são atrativos
Receitas globais estimadas em US$ 152,1 bilhões em 2019, um aumento de quase dois dígitos, 9,6%, na comparação com o ano anterior e manutenção da tendência de alta que persiste já há muito tempo. Estamos falando da indústria dos jogos eletrônicos ou Games, para simplificar e não de algum segmento importante do mercado de tecnologia.
Games mobile, incluindo celular e smartphone, são – de longe, o maior segmento nesse bolo, com U$$ 68,5 bilhões, sendo 45% do total, e devem crescer mais de dois dígitos em 2019 (11,6%). Já os games para consoles serão 32% do total, com US$ 47,9 bilhões, e os de PC são 21%, totalizando US$ 32,2 bilhões.
A soma dos números acima, estimados pela consultoria especializada Newzoo, é bem maior do que a receita de outras indústrias do entretenimento. O cinema, por exemplo, alcançou ‘apenas’ US$ 136 bilhões em 2018, segundo a IBISWorld. Isso, se somarmos US$ 41,7 bilhões das bilheterias com as vendas de filmes em disco e serviços de streaming, o chamado home video.

O ecossistema gamer inclui não só os estúdios e publicadoras de jogos, mas também fabricantes de consoles, computadores, notebooks, hardware e periféricos. A BGS é um termômetro

É interessante notar que esses US$ 152,1 bilhões são apenas a ponta do iceberg. Consideram gastos dos consumidores com jogos em mídia física ou distribuição digital, itens in-game, ou seja, gastos feitos ‘dentro’ dos jogos – uma armadura para uma personagem, por exemplo –, e serviços de assinatura de games. Mas não a venda de consoles, PCs e hardware de alto desempenho, periféricos como joysticks e joypads, mouses, headsets, gabinetes etc.
Desnecessário dizer que boa parte desses itens passa por distribuidores e revendedores, seguindo o modelo tradicional de cadeia de valor que impera também no segmento de Tecnologia da Informação. Não é incomum, aliás, encontrar tradicionais canais de TI investindo – e muito – no mercado gamer.
Afinal, games são e dependem fortemente de tecnologia, portanto não são estranhas as interconexões entre a cadeia brasileira de valor de TI e de games.
“Distribuidores de tecnologia identificaram um nicho e estão olhando para tudo em volta deste nicho. É uma estratégia bem sólida”, explica Mariano Gordinho, presidente executivo da Associação Brasileira de Distribuição de Tecnologia da Informação, a Abradisti. “O negócio de componente nasceu quando milhares de pequenas fábricas montavam computador no Brasil. Mas esse mercado praticamente sumiu. Quem percebeu o mercado gamer crescendo aproveitou uma oportunidade gigante.”
O Brasil, aliás, é o segundo maior mercado gamer da América Latina, com US$ 1,6 bilhão, atrás do México, com US$ 1,8 bilhão. É o 13º do mundo, bem longe de potências como os Estados Unidos, líder com US$ 36,9 bilhões em receitas; China com US$ 36,5 bilhões e Japão que soma US$ 18,9 bilhões. Ou seja, o espaço para crescimento no mercado nacional é grande.
A expectativa é que, quando computados os números de 2019 a América Latina como um todo apresente crescimento acima da média mundial, o que também serve para o Brasil. O otimismo é facilmente observável tanto no aumento das grandes feiras e eventos especializados no País – como é o caso da Brasil Game Show, como pela presença crescente de fabricantes de consoles, hardware e periféricos gamers.
Estas empresas crescem vistosamente portfólios e receitas, apostando no ótimo momento do mercado, no modismo dos e-sports e nos tickets elevados que este público faz certa questão de pagar – qualidade e desempenho custam caro. A grande oportunidade para distribuidores e revendas dessas tecnologias é não só óbvia como já rende frutos.
Fabricantes mostram suas armas
Gamers são o que até pouco tempo atrás a indústria de tecnologia chamava de entusiastas, ou seja, consumidores dispostos a gastar consideravelmente mais que a média de usuários finais ou corporativos de computadores, componentes de informática, periféricos e outros itens. Embora não seja uma feira de negócios, a Brasil Game Show – BGS, por exemplo, atrai cada vez mais esse público – e, claro, empresas interessadas nele.
O ecossistema gamer inclui não só os estúdios e publicadoras de jogos, mas também fabricantes de consoles, computadores, notebooks, hardware e periféricos. A BGS é um termômetro. Em sua última edição, em outubro de 2019, em estandes gigantescos houve demonstrações de jogos e, claro, computadores de última geração, placas de vídeo, mouses e teclados de alta precisão, headsets com som de altíssima fidelidade. Não são de modo algum, equipamentos baratos, mas mesmo assim encontram um público cativo.
A Asus, por exemplo, demonstrou na última edição da BGS um laptop da linha Zephyrus – equipamento com grande poderio gráfico para gamers antes indisponível no País e que ganhará fabricação local, segundo Manuel Castro Junior, diretor comercial da marca. Além do Zephyrus S, que começou a ser vendido por um preço sugerido de, acredite, R$ 25 mil, o ROG Strix G, outro notebook gamer, parte de R$ 8,5 mil.
Esses modelos marcam uma retomada da oferta de notebooks da Asus no Brasil, que estava em hiato desde a queda do mercado de computadores durante a crise econômica e a ascensão dos smartphones e tablets. O valor dos dois modelos importados, apesar de parecer bastante elevado, é subsidiado enquanto os produtos não são fabricados localmente, disse Fábio Faria, gerente de marketing da empresa.
Segundo Castro, as expectativas são positivas. “Como é um mercado em que não estávamos presentes e não tínhamos base, acredito que vai gerar um faturamento grande, sem dúvida alguma. Nosso objetivo agora é trazer cada vez mais novidades para este público”, reiterou. Isso inclui não só notebooks, como também placas de vídeo e outras peças de hardware específicas para o público gamer, mercado em que a empresa taiwanesa atua há vários anos no Brasil.
No território dos periféricos, outra empresa bastante empolgada é a HyperX, que nasceu como uma divisão de negócios gamer da estadunidense Kingston e que desde 2014 opera de modo independente. Além de mouses e teclados, a empresa atua com headseats, fones de ouvido com microfone que contam com recursos 7.1 e 3D. São acessórios tanto para o público de consoles como o de PCs, muito embora estes últimos sejam tanto mais exigentes como mais dispostos a gastar.
Para o último ano, a companhia projetou um crescimento superior a 60%. De acordo com Caio Ricci, gerente de desenvolvimento de negócios da marca, um dos motivos é a ampliação do mix de produtos no Brasil. “Fizemos lançamentos importantes na BGS”, destaca.
A Allied é a distribuidora exclusiva da marca no Brasil. O portfólio inclui ainda peças de hardware de alto desempenho, como SSDs e memórias RAM. Isso se deve, diz o executivo, ao perfil de compras desses consumidores. “Quando o gamer faz uma compra, ele adquire tudo o que precisa e não só um headset. O nível de exigência é altíssimo.”
Outra presença marcante nesse promissor segmento é a Intel. Carlos Augusto Buarque, diretor de marketing da marca no Brasil, explicou que para reforçar a marca, participou da BGS como patrocinadora já que, na maioria das vezes, não vende diretamente para o consumidor final, e apoiou os parceiros na feira.
“Quando olhamos para o mercado de computadores, ele se recupera lentamente, no mesmo ritmo do PIB. Já o segmento mais high-end, que é o gamer, cresce mais rápido e tem ticket médio mais alto”, ponderou o executivo. “É uma venda importante para nossos parceiros de canal porque o gamer não compra só o processador. Também leva acessórios.”
Embora não haja políticas específicas para parceiros que atuam no mercado gamer dentro do programa de canais da Intel, as pontuações geradas quando da venda de produtos mais high-end é maior por conta do preço. Ou seja, o estímulo também é maior em vendas de ticket elevado – o que no caso da fabricante inclui processadores topo de linhas, SSDs e, muito em breve, placas de vídeo.
O segmento de VGAs é a nova aposta da Intel para 2020. A unidade de negócios de PC da empresa responde por 50% de todo o faturamento, segundo Buarque, graças principalmente ao portfólio de processadores. Data centers é a unidade que responde pela outra metade.
Apostar em placas de vídeo é uma forma da Intel tentar manter a relevância no segmento de processamento lógico e, ao mesmo tempo, tomar terreno de duas companhias que dominam sozinhas o processamento gráfico off-board: Nvidia e AMD – esta última, aliás, a principal concorrente da Intel também no mercado de processadores, além de fornecedora de placas gráficas que equipam os consoles da Sony e da Microsoft.
VGAs costumam ser um dos itens mais caros e importantes para o segmento gamer: elas geram os gráficos de última geração em tempo real e seus saltos tecnológicos são responsáveis por parte da própria evolução dos games.
Canais especializados crescem
São as placas de vídeo, aliás, que levaram o distribuidor de tecnologia Oderço a se especializar no mercado gamer como forma de se diferenciar competitivamente. E com sucesso. Desde 2014 a empresa de Maringá – PR, opera com marca própria de produtos customizados, a Pcyes.
A marca teve início quando a Oderço passou a importar placas de vídeo customizadas da China, com modificações pensadas para o público brasileiro. A engenharia é feita no Brasil, mas a manufatura ocorre em fábricas chinesas, o que reduz custos. Uma vez importados, os produtos passam por controle de qualidade em um laboratório financiado pela distribuidora. Os chipsets base são tanto da AMD/ATI como da Nvidia.
Com o sucesso das VGAs vieram gabinetes, fontes, coolers, fans, cadeiras gamers e outros periféricos personalizados. Mas o carro-chefe, explica Daniel Takeo Motoyama, gerente de marketing da Oderço Distribuidora, são as placas de vídeo. “É a primeira marca brasileira desses componentes”, diz.
Com o sucesso da iniciativa, a distribuidora paranaense criou outras marcas, como a Vinik, de antenas, cabos, instrumentos musicais, equipamentos de som, hardwares e periféricos gamer; e a Movva, que vende computadores montados tanto para o público corporativo como para o entusiasta. Outro resultado positivo é um centro de distribuição nos Estados Unidos, em Miami, que inicia o ingresso da empresa nos mercados da América Latina e, também, Norte Americano.
Em 2018 a empresa importou quase 100 mil placas de vídeo – 81 mil deles sob a marca Pcyes. A expectativa para os próximos dois anos é de aumento, o que inclui desde a mudança para uma nova sede com 13 mil metros quadrados, até dobrar o faturamento da empresa.
Não parece impossível quando se olha para a Pichau Informática, varejista online de Joinville, Santa Catarina, que começou como revenda de hardware para os entusiastas e que cresceu a ponto de “dobrar de tamanho todo ano”, explica Luiz Carlos Junior, o Junior Pichau, diretor de conteúdo e criação da marca. “Saem da nossa linha de montagem, todos os dias, entre 250 e 350 computadores gamers”, informa.
As máquinas – desktops com configurações padronizadas ou que podem ser ‘montados’ online pelo comprador – vão para todo o País, passando por três centros de distribuição. O modelo deu tão certo que a empresa criou sua própria marca de periféricos, a Pichau Gaming, que inclui gabinetes, teclados e mouses, cadeiras gamers, fans e outros itens.
Os componentes das máquinas são comprados em parte diretamente de fabricantes, para ganhar escala, e de distribuidores. Os itens personalizados da marca Pichau Gaming são manufaturados na China, a exemplo da Oderço Distribuidora. O objetivo, claro, é baixar custos.
O próximo passo é a expansão internacional. “Estamos homologando nossos produtos em outros países já pensando em expandir. América Latina e do Norte primeiro”, destaca o diretor.
O fenômeno do e-sport e da plataforma de streaming
Um dos grandes impulsionadores do mercado gamer atual são, sem dúvida, os e-sports: competições organizadas de jogos eletrônicos que movimentam milhões de dólares mundialmente. Estão envolvidos times profissionais formados por ‘atletas’ com salários astronômicos, campeonatos com premiações milionárias e patrocínio de grandes marcas.
Há inclusive um movimento para que os e-sports sejam reconhecidos como esportes de fato e se tornem modalidades olímpicas – o que pode acontecer já a partir de 2024, nos Jogos de Paris.
Na BGS era difícil encontrar um estande que não promovesse algum tipo de competição entre visitantes e até mesmo torneios oficiais. Os mais famosos atletas de e-sport se transformaram em garotos propagandas de mouses, teclados iluminados e placas de vídeo, entre outros produtos, tomando parte do espaço antes ocupado apenas por jogadores de futebol e basquete.
Não à toa, segundo a Newzoo, a receita global do mercado de e-sports no mundo alcançará incríveis US$ 1,1 bilhão em 2019, ultrapassando a marca de um bilhão pela primeira vez e acumulando crescimento anual médio de 26,7%. Essa cifra inclui a venda de entradas, merchandising, direitos de transmissão e patrocínios.
Esse fenômeno traz a reboque um outro: o streaming de games. Competições oficiais de variados tamanhos e jogatinas despretensiosas de influenciadores digitais são agora transmitidas ao vivo pela internet – e alcançam audiências inimagináveis. Os usuários mais famosos ultrapassam milhões de espectadores. Isso fez surgir um outro tipo de concorrência: a de plataformas de streaming.
Google, com o YouTube Gaming, e Facebook atuam com suas plataformas de transmissão de jogos, muito embora na disputa por receitas ambos estejam atrás do Mixer, que foi comprado pela Microsoft em 2016, e do Twitch que é da Amazon desde 2014. Este último registrou em maio de 2018 cerca de 2,2 milhões de transmissões e 27 mil canais ativos.
Esta briga de ‘cachorros grandes’ é uma última prova de que o mundo da tecnologia e dos games está, e estará cada vez mais, completamente inter-relacionado.

As opiniões dos artigos/colunistas aqui publicados refletem exclusivamente a posição de seu autor, não caracterizando endosso, recomendação ou favorecimento por parte da Infor Channel ou qualquer outros envolvidos na publicação. Todos os direitos reservados. É proibida qualquer forma de reutilização, distribuição, reprodução ou publicação parcial ou total deste conteúdo sem prévia autorização da Infor Channel.