Caótico, irracional, provavelmente o mais complicado e regressivo do mundo. A lista é de alguns comentários que podemos fazer, sem medo de errar, sobre o atual sistema tributário brasileiro. Criado em 1965, o nosso modelo de cobrança de impostos sofreu diversas alterações desde então, mas segue se apresentando com um grande obstáculo para o desenvolvimento e a redução da desigualdade no país. Precisamos urgentemente de uma reforma tributária.
Os problemas não são apenas a complexidade e insegurança jurídica, dois gargalos evidentes para o empresariado brasileiro. Também estamos diante de uma lógica injusta e regressiva, que causa concentração de renda por cobrar mais imposto de quem ganha menos, em uma distribuição de carga que tende a agravar muitas de nossas mazelas.
Diante dessas inconsistências, um projeto tramita na Câmara dos Deputados, apresentado pelo deputado federal Luiz Carlos Hauly: a Reforma Tributária, que visa simplificar a burocracia, melhorar a fiscalização, tornar o nosso sistema progressivo de acordo com a renda e aumentar a segurança jurídica do contribuinte. Trata-se de uma iniciativa modernizadora, muito bem estruturada para aumentar a eficiência e distribuição de renda no Brasil, por enquanto sem reduzir a carga tributária e a arrecadação do governo.
Atualmente, contamos com 93 impostos, contribuições e taxas no país – sendo 11 impostos e 3 contribuições principais. De acordo com um relatório do Banco Mundial, atender a todas essas exigências, para se certificar de que os recolhimentos estão corretos, consome uma média de 1.958 horas por ano nas empresas. O prejuízo estimado dessa burocracia para a economia é de R$ 60 bilhões anuais.
Pela reforma proposta, essas 14 cobranças principais seriam reduzidas a apenas 3: o Imposto Seletivo, o Imposto de Renda e o IVA (Imposto sobre o Valor Agregado). O último seria responsável por reduzir a nossa grave cunha fiscal, eliminando contrassensos como impostos sobre impostos.
Os benefícios dessa simplificação podem ser constatados com exemplos de sucesso já aplicados no Brasil. Os maiores deles são o Imposto Simples Nacional e o sistema de Microempreendedor Individual (MEI), criados para beneficiar as pequenas empresas. A centralização de diversos impostos em um só, a ausência de burocracia e a diferenciação das alíquotas levando em conta a realidade dos setores resultou em grandes benefícios tanto para o governo quanto aos empreendedores – em 10 anos, foram arrecadados cerca de R$ 543 bilhões em impostos e foram abertas 6.7 bilhões de MEIS e 5 milhões de micro e pequenas empresas. Além dos diversos empregos gerados.
Outro espelho deve ser a China. Desde 1994, o gigante asiático vem desenvolvendo reformas em seu sistema fiscal, com o intuito de modernizar a economia e sustentar sua integração com o mundo. A arrecadação, antes descentralizada e confusa, foi reestruturada com o objetivo de desburocratizar as operações no país. Para não prejudicar as províncias, que tiveram alguns tributos extintos, o governo central passou a distribuir entre elas algumas contribuições tipicamente nacionais (como o imposto de renda). Uma forma de aumentar a eficiência da máquina em todos os níveis.
Um raciocínio semelhante é aplicado na nossa proposta de reforma fiscal, que, entre outras medidas, busca o equilíbrio de arrecadação dos poderes municipal, estadual e federal. Não há como detalhar toda a engenhosidade do projeto em um artigo, mas é possível separar dez medidas principais, explicadas aqui muito resumidamente, de acordo com o relatório do deputado Hauly:
1) Criar um imposto de renda progressivo;
2) Reduzir alíquotas para a alimentação;
3) Isentar totalmente as exportações e os bens de ativo fixo das empresas, com o propósito de promover a reindustrialização do país;
4) Diminuir o custo de contratação e garantir recursos para o INSS;
5) Extinguir taxas como o ICMS, IPI, ISS, COFINS, Salário Educação e criar no lugar dois impostos: um IVA clássico e um Seletivo monofásico de destino federal sobre setores como energia elétrica, combustíveis líquidos e derivados, entre outros;
6) Fortalecer os Municípios, transferindo às prefeituras todos os tributos sobre propriedades;
7) Encerrar imediatamente a “guerra fiscal” entre Municípios e Estados, cobrando o IVA e o Seletivo no Destino;
8) Acabar com a cunha fiscal nos empréstimos bancários – extinguindo o IOF e outros tributos;
9) Manter o Super Simples para as Micro e Pequenas Empresas;
10) Incrementar novas tecnologias e softwares, universalizando o uso da nota fiscal eletrônica e a cobrança no ato da compra.
A aprovação de todas essas iniciativas representaria um verdadeiro marco para a nossa sociedade. São ideias que contemplam diversos problemas nacionais: a geração de empregos, a diminuição da desigualdade social e a segurança tributária, por exemplo – além de não afetar a viabilidade econômica do governo, abrindo o caminho para que a arrecadação aumente graças a fatores como a redução da sonegação e o crescimento da economia. Um projeto tão benéfico precisa ser encarado como prioridade. Vamos, sim, unir esforços pelas Reformas Previdenciária e Trabalhista, entre outras, mas sem deixar de lado os ganhos que apenas são possíveis com a Reforma Tributária.
*Francisco Camargo é Presidente da ABES – Associação Brasileira das Empresas de Software
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